A ausência da figura paterna na afetividade de meninos
Li, certa vez, um artigo de biologia em que o autor afirmava que a natureza teria sido muito
tolerante com o sexo masculino no que diz respeito a função procriadora. O artigo apontava as
diferenças de investimento energético entre o homem e a mulher na atividade reprodutiva. De fato,
enquanto o papel do homem limita-se a ceder alguns espermatozoides, a mulher responde por uma
parcela infinitamente maior no processo, implicando numa série de transformações no corpo, na
mente, no estado emocional, além de um longo período de gestação no qual tem que se dedicar, quase
que exclusivamente, à maternidade.
Logicamente, essa afirmação levava em conta apenas os aspectos biológicos presentes na
reprodução humana, mas de qualquer forma é a base para entender alguns aspectos psicológicos na
constituição das famílias, sobretudo se observarmos que essa pouca contribuição, também se repete
nas atividades de cuidado e educação dos filhos. A presença do genitor masculino é fraca, esse
distanciamento sempre foi justificado pelo papel de provedor em que o homem necessitava sair de casa
para garantir sustento à família. Infelizmente, apesar das mudanças ocorridas nos últimos tempos nos
modelos de família, essa desigualdade no desempenho das funções parentais ainda persiste.
Esse cenário é o pano de fundo para a triste realidade levantada no recente estudo publicado
pelo UOL a pedido da Natura, onde ficou demonstrado que apenas 5 a cada 10 meninos adolescentes
têm certeza do amor paterno. A pesquisa, inclusive, traz um significativo recorte de raça e etnia: os
meninos negros têm menos certeza de serem amados pelo pai (49%) do que os meninos brancos
(35%). A ausência física é acompanhada da frieza afetiva provocando uma dificuldade em expressar
atenção e carinho de forma natural. Muitos genitores tentam compensar essa falta, dando presentes
materiais, mas isso não ajuda a criança a aprender, de fato, o que é amor real e como ele se constrói.
O estereótipo masculino começa a ser construído na infância através da aprendizagem
observacional, conforme teorizou o psicólogo canadense Albert Bandura na década de 60. De acordo
com Bandura, as pessoas não aprendem apenas por suas próprias experiências, mas também por
observar e imitar os demais. Nesse sentido, o convívio social torna-se fator relevante no
desenvolvimento da personalidade. Imaginem o futuro de meninos que hoje crescem observando o
distanciamento paterno associado à desvalorização do sexo feminino, violência contra a mulher,
machismo, etc? Certamente, não serão cidadãos que construirão uma sociedade justa onde o respeito
pelo outro prevalecerá. A presença positiva dos genitores doadores de afeto, gentileza e bondade é o
caminho possível para se construir um mundo melhor.
Romildo R.Almeida
Psicólogo clínico
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